SBP Sociedade Brasileira de Psicologia

As pessoas podem ser felizes?

Por José Aparecido da Silva, professor visitante da Universidade Federal de Juiz de Fora e professor titular da Universidade de São Paulo, Campus de Ribeirão Preto, SP

Com o propósito de capturar o que as pessoas significam por felicidade, os pesquisadores interessados no estudo científico dela propuseram o termo bem-estar subjetivo. O bem-estar subjetivo refere-se às avaliações que as pessoas fazem de suas próprias vidas e engloba tanto os julgamentos cognitivos da satisfação com a vida quanto as apreciações afetivas de PROF. José Aparecidosentimentos e emoções. Esta concepção enfatiza a natureza subjetiva da felicidade e supõe que os seres humanos sejam os melhores juízes de sua própria felicidade. Assim considerando, os pesquisadores têm descoberto a significância de componentes separados do bem-estar subjetivo que se harmonizam de forma bastante coerente. Estes componentes incluem a satisfação com a vida (julgamentos globais da própria vida), satisfação com importantes domínios da vida (satisfação com o próprio trabalho, saúde, casamento, amigos, etc.), afeto positivo (prevalência de emoções e sentimentos positivos) e baixos níveis de afeto negativo (prevalência de emoções e sentimentos desagradáveis).

Mas as pessoas podem ser felizes? Numa tentativa para responder a esta questão, torna-se importante fazer a distinção entre felicidade ideal e felicidade real. Felicidade ideal pode ser definida como felicidade que é completa e duradoura e que alcança o todo da vida. Tal felicidade, perfeita, pura e perpétua, possui padrões extremamente elevados e pode, realmente, estar muito além do alcance de qualquer um. Todavia ainda é possível que as pessoas vivenciem emoções predominantes positivas e estejam satisfeitas com suas vidas. A felicidade real, como ela tem sido denominada, é focalizada a partir de duas questões pertinentes: as pessoas podem registrar sua felicidade? É a felicidade um fenômeno adaptativo e evolutivamente plausível?

Evidências obtidas a partir de vários estudos em diferentes culturas sugerem que a resposta à primeira questão é afirmativa. De fato, pesquisas indicam que uma grande maioria das pessoas situa-se numa faixa positiva na escala de felicidade, incluindo pessoas com aparentes desvantagens, tais como as paraplégicas ou aquelas nas faixas de rendas inferiores. Recente levantamento corrobora este padrão de resultados, revelando que 84% dos norte-americanos se veem como muito felizes ou extremamente felizes. Do mesmo modo, 86% das 43 nações incluídas no estudo tiveram níveis de felicidade médios acima do valor mediano da escala de felicidade. Além disso, a maioria das pessoas registra ser feliz a maior parte do tempo. Logo, os humanos parecem ter uma predisposição para se situarem nos níveis médios de felicidade, o que nos leva a responder a segunda questão, ou seja: quais são as funções adaptativas da felicidade?

Tem sido reconhecido que as emoções negativas (por exemplo, medo, raiva e ansiedade) fazem um indivíduo focalizar problemas ou ameaças imediatas, portanto contribuindo para o ajustamento evolutivo. Porém apenas recentemente tem se começado a entender as vantagens positivas engendradas pelos sentimentos positivos. Por exemplo, os sentimentos positivos permitem que os indivíduos ampliem seu repertório de pensamento-ação e construam, ao longo do tempo, recursos intelectuais, psicológicos, sociais e físicos. Em outras palavras, afeto positivo e bem-estar geral produzem um estado a partir do qual os indivíduos podem confidentemente explorar o ambiente e abordar novos objetivos, assim permitindo-os construírem importantes recursos pessoais.

Assim, felicidade não é somente um epifenômeno caracterizado por múltiplas facetas ou dimensões, mas é também um fenômeno adaptativo do ponto de vista evolutivo que traz e agrega vários benefícios em diferentes arenas da vida.

Fonte: Tribuna de Minas. Seção Tribuna Livre 19-09-2018

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